Artigo: St. Pierre é a evolução do MMA


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A maioria da mídia especializada adorou esse UFC 124. Pra mim foi um evento apenas razoável. Sem nenhuma luta incrível, mas com todas bem disputadas, me lembrou os dias de criança quando mamãe servia bife e arroz e perguntava se estava bom. Com batata frita estaria ótimo, se ao invés de bife fosse frango, estaria ruim, mas do jeito que estava, era “médio”. Esse UFC 124 foi um evento assim. Médio. UFC 117 com Anderson x Sonnen, Fitch x Thiago, Guida x Rafael, Cigano x Roy Nelson, ou UFC 121 com Velasquez c Lesnar, Sanchez x Paulo Thiago, Schaub x Napão são dois exemplos de eventos melhores. Para mim o ano fechará de modo explosivo com o WEC 53.

Georges St. Pierre x Josh Koscheck:

St. Pierre é o lutador perfeito. Causa a maior quantidade de dano sofrendo o mínino, não faz mais esforço do que precisa e o que faz é mais do que suficiente para desativar e desmoralizar seus adversários, não fere mais do que necessário seu oponente e faz wrestlers campeões da NCAA ficarem com vergonha de suas medalhas. Isso tudo sem palavrões ou ameaças. É capa da Men’s Health, atleta do ano no Canadá, modelo fotográfico e ainda distribui elogios e respeito para o derrotado. St. Pierre é a evolução do MMA, por isso suas lutas tendem a ser chatas, como essa foi. Um atacando de esquerda e outro sendo atingido no olho direito. Isso resume bem a luta. As reviravoltas que adoramos ver, lutadores que saem de uma posição complicada para mudar a história, trocações violentas e despretensiosas, nada disso há nas lutas do canadense. São conseqüências de erros de estratégia ou técnicos, e St. Pierre não erra mais. Errou uma vez contra Serra e foi nocauteado, uma vez contra Hughes e foi finalizado. As chances de erro foram calculadas e reduzidas a quase zero pelo seu sistema.

Mais do que assistirmos as suas lutas torcendo por algo muito emocionante, que não acontecerá, ou pela sua derrota apenas para vê-lo em uma situação diferente, é melhor aceitarmos que ele é um dos melhores atletas de todos os tempos e admirarmos suas performances. Admirarmos como ele consegue neutralizar lutadores excelentes como Fitch, Thiago, Penn, Koscheck, com uma aplicação estratégica visionária. Mais do que achar a luta legal, devemos estudar seus movimentos e escolhas táticas. St. Pierre faz lutadores incríveis parecerem que nem deveriam lutar MMA. Ele lhes tira mais do que a vitória, St. Pierre lhes subtrai de arrogância e acalma a alma. Dizem que as pessoas que tem uma experiência de quase morte e vêem a luz no fim do túnel voltam diferentes, mais simples. Quem luta com St. Pierre volta mudado. Como se fizessem um intensivão para monge no Tibet ou retornassem de um retiro espiritual. Até Dan Hardy abriu mão, mesmo que temporariamente, de seu moicano. Ao fim de cada luta Pierre está como sempre, inabalado e igual. Como um pai que não quer mais brincar de luta com o filho pequeno e o coloca para dormir. Cabe ao adversário diminuir e aceitar sua insignificância momentânea, optar pelo lado da grandeza em ser humilde do que ser humilhado tentando ainda se mostrar competitivo.

Freddie Roach já treinou 27 campeões de boxe incluindo o fenômeno Many Pacquiao e tem em Pierre seu melhor aluno oriundo do MMA. Freddie afirmou que Georges ganharia a luta com cruzados de esquerda. E foram vários cruzadinhos e jabs de esquerda que definiram a luta.

St. Pierre é um dos maiores atletas do mundo. Independente do esporte, treina com os melhores, viaja o mundo todo atrás de mais conhecimento. Sempre coloca mais carvão na sua fornalha. A máquina não para. Shields não tem a menor chance real de vencê-lo por mais que a máquina publicitária do UFC vá nos convencer do contrário. Pierre já admitiu que pode subir de peso e é o que deve fazer. Lutadores naturalmente mais pesados têm potência nos golpes e força muscular que podem estar além do que ele vem experimentando, e isso criaria lutas interessantes de verdade. St. Pierre conseguiria vencer Anderson Silva com jabs? Derrubaria Chael Sonnen? Em 2011 ele deve responder algumas dessas questões, até lá, vai passar por cima de qualquer adversário como Ghandi passeava por entre invejosos e detratores, transformando-os em seguidores ou seguindo em frente e ignorando sua presença.

Koscheck tomou uma surra de jabs nesse UFC 124. Sua explosão, cruzados perigosíssimos e quedas em nível de campeão mundial, tudo parou no couro da luva esquerda de Pierre. Parecia um touro doido indo de encontro a ponta da espada do toureador espanhol. Josh disse que ia fazer um monte de coisas e não fez nada. Era de se esperar. Pierre venceu, ao fim dessa luta, o trigésimo round seguido.

O Koscheck que fingia ter tomado dedadas no olho ou joelhadas na cabeça para prejudicar seu adversário saiu dessa luta um pouco mais homem ao aceitar continuar mesmo com o osso da órbita fraturado. Nesse tipo de fratura estilhaços de osso se agarram ao globo ocular zerando a visão, causando dor e impedindo a rotação. O médico insistiu em que abandonasse a luta, mas ele perseverou. Mais um que sai da luta contra Pierre com uma medalhinha de honra ao mérito. Foi assim com Hardy, que teve o braço estalado algumas vezes e não bateu, Fitch, que apanhou cinco rounds e continuou de pé, Thiago que teve os dois olhos fechados mas continuou em frente. Todos esportivamente vencidos, mas espiritualmente fortalecidos. Para eles, seu algoz poderia se chamar São Pierre.

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